domingo, 20 de setembro de 2009

Tornar-me em Rita

Agora, uma figura feminina.
Rita Levi - Montalcini

Só pra quem não conhece, conhecer:
Ela foi uma das poucas mulheres ganhadoras do prêmio Nobel em Medicina, por suas investigações dentro da área da neurologia. Que, além de toda a dedicação ao trabalho, é um exemplo de pessoa e mulher.

Há um tempo atrás recebi um material enviado por um amigo sobre ela e, fiquei assim... absurdamente encantada, apaixonada. Como com Saramago, mas mais no contexto de nunca te vi, sempre te amei. Sem contar que ("eu e Saramago") também compartilhamos da ideia d'ela ser nossa alma gêmea. E olha que temos cá os nossos amores individuais e não atribuímos este título a uma única e qualquer pessoa. Mas sim, a um conjunto numa única pessoa.

Rita em mim desperta amor e respeito.

É umas das pessoas, assim, que eu gostaria de sentar em qualquer lugar e conversar... Mas não sobre o prêmio. Sobre a vida. Lições de vida, sabedoria, experiência... de um cérebro com idade de um século.. essas coisas... Já pensou?

Pra finalizar deixo parte da transcrição de seu discurso principal e entrevistas:





“Nunca pensei em mim mesma. Viver ou morrer é a mesma coisa. Porque, naturalmente, a vida não está neste pequeno corpo. O importante é a maneira como vivemos e a mensagem que deixamos. Isso é o que nos sobrevive. Isso é a imortalidade”.
“É ridícula a obsessão do envelhecimento. O meu cérebro é melhor agora do que foi quando eu era jovem. É verdade que vejo mal e oiço pior, mas a minha cabeça sempre funcionou bem. O fundamental é manter ativo o cérebro, tentar ajudar os outros e conservar a curiosidade pelo mundo”.

“ Sou contra a reforma ou outro qualquer outro tipo de subsídio. Vivo sem isso. Em 2001 não cobrava nada e tive problemas económicos até que o presidente Ciampi me nomeou senadora vitalícia”.



MONTALCINI, Rita Levi
· Entrevista concedida em 16/04/2009:
http://www.italianos.it/2008/noticias/integra.aspx?materia=10953


· Entrevista concedida em 22/12/2005:

- Como vai celebrar seus 100 anos?

-Ah, não sei se viverei até lá, e, além disso, não gosto de celebrações. No que eu estou interessada e gosto é do que faço cada dia.!

-E o que você faz?

-Trabalho para dar uma bolsa de estudos para as meninas africanas para que estudem e prosperem … elas e seus paises. E continuo investigando, continuo pensando.

-Não vai se aposentar?

-Jamais! Aposentar-se é destruir cérebros! Muita gente se aposenta e se abandona… E isso mata seu cérebro. E adoece.


- E como está seu cérebro?
-Igual quando tinha 20 anos! Não noto diferença em ilusões nem em capacidade. Amanhã vôo para um congresso médico.

- Mas terá algum limite genético ?

- Não. Meu cérebro vai ter um século…., mas não conhece a senilidade.. O corpo se enruga, não posso evitar, mas não o cérebro!

-Como você faz isso?
- Possuímos grande plasticidade neural: ainda quando morrem neurônios, os que restam se reorganizam para manter as mesmas funções, mas para isso é conveniente estimulá-los!

-Ajude-me a fazê-lo.
-Mantenha seu cérebro com ilusões, ativo, faz ele trabalhar e ele nunca se degenera.

-E viverei mais anos?
-Viverá melhor os anos que vive, é isso o interessante. A chave é manter curiosidades, empenho, ter paixões….

-A sua foi a investigação cientifica…
-Sim e segue sendo.

-Descobriu como crescem e se renovam as células do sistema nervoso…

-Sim, em 1942: dei o nome de Nerve Growth Factor (NGF, fator do crescimento nervoso), e durante quase meio século houve dúvidas, até que foi reconhecida sua validade e em 1986, me deram o premio por isso.

-Como foi que uma garota italiana dos anos vinte converteu-se em neurocientista?
-Desde menina tive o empenho de estudar. Meu pai queria me casar bem, que fosse uma boa esposa, boa mãe… E eu não quis. Fui firme e confessei que queria estudar.

-Seu pai ficou magoado?
-Sim, mas eu não tive uma infância feliz: sentia-me feia, tonta e pouca coisa… Meus irmãos maiores eram muito brilhantes e eu me sentia tão inferior…



- Vejo que isso foi um estimúlo...

-Meu estimulo foi também o exemplo do médico Albert Schweitzer, que estava em África para ajudar com a lepra. Desejava ajudar aos que sofrem, isso era meu grande sonho…!


-E você tem feito…, com sua ciência.

- E, hoje, ajudando as meninas da África para que estudem. Lutamos contra a enfermidade, a opressão da mulher nos paises islâmicos por exemplo, além de outras coisas…!

- A religião freia o desenvolvimento cognitivo?

-A religião marginaliza muitas vezes a mulher perante o homem, afastando-a do desenvolvimento cognitivo, mas algumas religiões estão tentando corrigir essa posição.

-Existem diferencias entre os cérebros do homem e da mulher?

- Só nas funções cerebrais relacionadas com as emoções, vinculadas ao sistema endócrino. Mas quanto às funções cognitivas, não tem diferença alguma.

-Por que ainda existem poucas cientistas?
- Não é assim! Muitos descobrimentos científicos atribuídos a homens, realmente foram feitos por suas irmãs, esposas e filhas.

-É verdade?
A inteligência feminina não era admitida e era deixada na sombra. Hoje, felizmente, tem mais mulheres que homens na investigação cientifica: as herdeiras de Hipatia!

- A sábia Alexandrina do século IV…
- Já não vamos acabar assassinadas nas ruas pelos monges cristãos misóginos, como ela. Claro, o mundo tem melhorado algo…

-Ninguém tem tentado assassinar a você…
- Durante o fascismo, Mussolini quis imitar o Hitler na perseguição dos judeus…, e tive que me ocultar por um tempo. Mas não deixei de investigar: tinha meu laboratório em meu quarto…E descobri a apoptose, que é a morte programada das células!

-Por que tem uma alta porcentagem de judeus entre cientistas e intelectuais?
- A exclusão estimula entre os judeus os trabalhos intelectivos e intelectuais: podem proibir tudo, mas não que pensem! E é verdade que tem muitos judeus entre os prêmios Nobel…

-Como você se explica a loucura nazista?
- Hitler e Mussolini souberam como falar ao povo, onde sempre prevalece o cérebro emocional por cima do neocortical, o intelectual. Conduziram emoções, não razões!

- Isto está acontecendo agora?
- Porque você acha que em muitas escolas nos Estados Unidos é ensinado o creacionismo e não o evolucionismo?

-A ideologia é emoção, é sem razão?
- A razão é filha da imperfeição. Nos invertebrados tudo está programado: são perfeitos. Nós não e, ao sermos imperfeitos, temos recorrido a razão, aos valores éticos: discernir entre o bem e o mal é o mais alto grau da evolução darwiniana!

-Você nunca se casou ou teve filhos?
- Não. Entrei no campo do sistema nervoso e fiquei tão fascinada pela sua beleza que decidi dedicar todo meu tempo, minha vida!

- Lograremos um dia curar o Alzheimer, o Parkinson, a demência senil?
- Curar… O que vamos lograr será frear, atrasar, minimizar todas essas enfermidades.

- Qual é hoje seu grande sonho?
- Que um dia logremos utilizar ao máximo a capacidade cognitiva de nossos cérebros.

- Quando deixou de sentir-se feia?
- Ainda estou consciente de minhas limitações!

-Que tem sido o melhor da sua vida?
-Ajudar aos demais.

-O que você faria hoje se tivesse 20 anos?
-Mas eu estou fazendo!!!!



E eu como já passei dos 20 e não fiz muito do que quero, espero que se eu chegar perto, porque 100 aninhos são muitos, eu também possa ter feito.

Fontes:
http://caderno.josesaramago.org/2008/10/26/quando-for-crescido-quero-ser-como-rita/
http://www.italianos.it/2008/noticias/integra.aspx?materia=10953
http://www.espiritualidades.com.br/Not_2009/2009_06_20_Rita_Levi-Montalcini_cerebro_nao_se_enruga.htm
http://sexismoemisoginia.blogspot.com/2009/04/rita-levi-montalcini-uma-mulher-e-um.html

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